quarta-feira, 24 de setembro de 2008

TEATRO E O BRASIL: QUE TEATRO É ESSE?

Desde sempre, ou quase sempre, nosso referencial foi o imaginário além-mar, o velho mundo (e tem gente que acha o máximo saber “tudo” sobre teatro europeu, mas não sabe nada sobre a grandeza da alma de um povo em ebulição, nós, brasileiros); outros, por sua vez, deslumbram-se com os penduricalhos e cacarecos vindos diretamente da bróduêi, produções caríssimas, onde o mérito da montagem está justamente em custar caro. Bosta embalada em caixa de luxo. Temos também aqueles que seguram com unhas e dentes o privilégio(?) do pensamento acadêmico, arvorando-se em raízes coletivas irrigadas com seiva-sangue de cada um de nós e de nossos ancestrais. Você já parou pra pensar sobre isso? Que tempo é esse em nós vivemos? Tempo onde a exploração e o abuso de poder, destroem toda a possibilidade de nos entendermos como ‘nós’ e não como ‘eu’, como ensinam os índios. Talvez esteja aí a raiz da construção do coletivo artístico. A obra de arte cênica é constituída de vários elementos, texto, gesto, luz, música, dança, figurino etc, além da contribuição individual de cada artista envolvido (atores, diretor, iluminador, cenógrafo, dramaturgo, direção de arte etc). Porém, é nítido aos sentidos dos espectadores bem como dos atores, quando uma apresentação não atinge o lugar da obra de arte cênica, lugar onde o lúdico aliado a reflexão levam artistas e platéia a criarem, juntos, a sensação de um ‘outro’ lugar, de outras possibilidades. Batata. Quando esse ‘outro’ lugar não acontece, quando a obra de arte cênica não captura o peixe dourado na rede tecida em cumplicidade entre atuantes e expectadores... tem mão de alguém desandando o tacho de Yayá. Tem gente sendo canibal, não no sentido Oxalá-Osvaldiano-Pajé-Antropafágico, mas no sentido de fera disfarçada em pele de cordeirinho, pronta pra devorar filhotes, como sempre foi na feitura do Brasil. A elite se fartando, claro que sempre as custas dos filhos da pátria Medéia-mãe gentil...e cagando na seqüência em cima de nossas cabeças. Qual ética que nos serve? A ética construída pelo homem branco, rico, exclusivo e excludente? Essa é a ética que vamos aceitar? Ou quiçá, nesse momento, não se faz o tempo-espaço da construção de um pensamento soberano da nação Brasil e do povo brasileiro. Lição de Darcy Ribeiro: “ O BRASIL TÁ AÍ. VÁ, INVENTE O BRASIL QUE VOCÊ QUER, CONSTRUA O BRASIL, POIS MUITA COISA PRECISA SER FEITA E NÃO HÁ TEMPO A PERDER Tudo está na natureza, encadeado e em movimento. Arte, política e ética, tripé de sustentação para a construção de um caminho para a América Latina. Um caminho, um atalho, uma saída digna, criativa e próspera que se faça presente no aqui e agora. País do futuro? Não. Obrigado. País do presente, agora e aqui. Se não meu irmão, não tem jeito. A alternativa é atuar, dentro e principalmente fora de cena. Atuar fora de cena, fazer de nossas vidas nossa própria obra, atuar coletivamente. Atuação política, porque se não, alguém vai atuar por nós. E como homem de teatro, uma coisa eu posso garantir: quando falamos em nome do coletivo, nosso discurso ganha força e eficácia, espécie de força e delicadeza que reside na lâmina da espada do samurai. Construir o coletivo. Esse é nosso desafio enquanto artistas e principalmente enquanto povo. Povo brasileiro. Oxalá Deus queira!

Eduardo Bento
Cia. Teatro São Gonçalo